Primeira parte de uma entrevista feita pelo autor deste blog aos Filhos da Pauta, no Rock Rendez-Vous, no início dos anos 80.
Apesar de já se verificar em menor quantidade, de vez em quando ainda aparece algum grupo de rock português cuja música tem qualidade, como por exemplo os Filhos da Pauta, que brevemente vão editar um disco. Eles dão-nos, segundo nos disseram “música a martelo”, afirmação de que discordo pois a música deles não é feita às três pancadas, antes pelo contrário. Pelo que nos foi dado a ouvir durante a sua actuação no rock Rendez-Vous, a música do grupo tem qualidade e o seu vocalista tem uma voz extremamente potente, apesar de um pouco imatura. Os Filhos da Pauta são um grupo que promete.
Após esta pequena introdução, vamos passar à entrevista que lhes fizemos no final da sua actuação no RRV.
Perg. – Em primeiro lugar, gostava que um de vocês fizesse a apresentação do grupo.
Resp. – (Carpinteiro) O grupo é formado por mim na voz, Quintela no baixo, Joca na guitarra, Araújo na bateria e o Jorge nas teclas.
Perg. - Como é que se definem musicalmente e quais as vossas influências?
Resp. – (Carpinteiro) Influências directas, propriamente ditas, não temos. Eu tenho mais influências dos fado do que do Rock n’ Roll e é por isso que nos dedicamos um bocado a essa linha. Tu até podes ver que quando estou em palco, a cantar, exploro um bocado essas influências do fado. A nível do grupo, as influências que podem existir são por causa destes anos todos de Rock n Roll. Quanto a influências portuguesas, é só o fado e o folclore. A nossa sigla de apresentação é que “somos a banda mais fatela e mais malaica de 1982”, porque repara quando uma pessoa se põe com olhos citadinos a olhar para fora da cidade, é capaz de chamar fatela ou malaico a uma certa camada da população e em cima do palco é essa camada que eu pretendo representar, o povo.
Perg. – Porquê o povo fora da cidade e não o de dentro, já que vocês passam a maior parte do tempo na cidade?
Resp. – (Carpinteiro) O povo da cidade pouco me diz.
(Joca) – Repara que o mise-en-scene dele tenta cair no ridículo e destruir aquela imagem de novo-rico, a imagem do gajo que partiu dos primórdios dos campesinos com as botas ao pescoço e hoje em dia é um novo-rico. Ele tenta mostrar isso, que é uma pessoa revoltada e a sua coreografia em palco tenta mostrar os males da sociedade que o rodeia, por exemplo nas cidades.
Perg. – Através das letras, tentam fazer alguma crítica à sociedade?
Resp. - (Carpinteiro) Não é bem isso. Por exemplo, o povo da aldeia onde eu vivo é um povo que está sempre naquela de revolta.
Perg. – Porquê?
Resp. – Não existe uma razão directa do porquê da revolta do povo. O povo nunca está contente e não existe uma razão directa que justifique isso; se lhes fores perguntar porquê, eles não sabem. Eu ligo-me mais com o povo de fora da cidade.
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