Mesmo com alguns lugares vagos na plateia sentada, e mesmo com as bancadas praticamente despidas de público, a noite de 02 de Novembro ter-se-á tornado inesquecível para quem se deslocou ao Coliseu dos Recreios de Lisboa.
Eram 21 horas em ponto quando se deu início a um dos melhores concertos dos Tindersticks em Portugal.
O grupo oriundo de Nottingham, liderado por Stuart A. Staples, Neil Frase e Dave Boulter, celebra nesta digressão os 20 anos de carreira, e quem diria que atendendo à característica da sua música, muito fora dos parâmetros comerciais e recheada de pormenores por vezes imperceptíveis, chegariam aos dias de hoje, e ainda por cima em grande forma, como ficou provado com o disco de 2012 "The Something Rain".
Quanto ao concerto desta noite, ele foi dividido em duas partes, sendo a primeira de carácter ainda mais intimista e na qual os músicos ocupavam o centro do palco, com Stuart Staples sentado. Foi ao som de "Trickin", do álbum "Can Our Love..." de 2001 que começou uma excelente noite de música.
Sobriamente, as luzes incidiam somente sobre Staples e Boulter. Enquanto a excelente voz de Staples enchia o recinto, Boulter extraía pequenos sons das teclas e todos os outros elementos do grupo permaneciam na penumbra, à espera de, também eles, entrarem nesta viagem que nos iria transportar durante quase duas horas e meia, num tempo repleto de grandes emoções graças a uma música tocante e contagiante, chegando, por momentos, a provocar sorrisos e expressões faciais de felicidade por parte de uma plateia que vivia momentos de grande intensidade ao som de algumas das mais belas canções que, teimosamente, continuamos a ouvir de forma arrebatadora e que têm o poder de nos alhear de tudo o que nos rodeia.
Nem parecia que estávamos numa sala muito longe de estar cheia. Se não víssemos e apenas ouvíssemos os aplausos do público, podíamos afirmar desde o primeiro momento que o Coliseu tinha esgotado mais uma vez, para assistir a uma noite de culto aos Tindersticks, culto esse bem audível no final de cada tema (pelos imensos aplausos) e durante as canções (pelo impressionante silêncio).
Se a primeira parte do concerto foi numa toada mais calma, onde foi possível ouvir as recentemente regravadas "A Night to Still", "Marseilles Sunshine", "Friday Night", entre outras canções, a segunda parte foi ligeiramente mais dinâmica, continuando a percorrer a obra do grupo, desde o mítico "Tindersticks" de 1993 até "Across Six Leap Years" de 2013, disco em que regravaram alguns dos seus clássicos.
Numa noite de grandes emoções que teve como banda-sonora um conjunto de belas canções, é extremamente difícil destacar um momento, pois para além da perfeição do som (do melhor que ouvi até hoje no Coliseu), todo o ambiente estava igualmente perfeito (à excepção da ausência de público).
Arrisco, no entanto, a destacar alguns momentos, como por exemplo, "Say Goodbye To The City", numa interpretação cheia de energia quase próxima de uma Jam Session; "Sometimes it Hurts" e "Travelling Light", que contaram com a bela voz de Gina Foster; se em "Sometimes it Hurts" a participação foi mais discreta, talvez com o intuito de não fazer esquecer a grande Lhasa de Sela, já em "Travelling Light", Foster quase fez esquecer Carla Torgerson, a voz dos Walkabouts; destaque ainda para "Can We Start Again?", um tema mais "dançável" que pôs todo o Coliseu a bater palmas do primeiro ao último acorde, numa música que se aproxima ligeiramente do Soul. Houve ainda "This Fire of Autums", "Medicine", Another Night In, Sleepy Song", "Dying Slowly" e, entre muitas outras, a terminar a segunda parte surge, "My Oblivision".
Quanto ao tema escolhido para terminar a noite, nada melhor do que "My Sister", a funcionar como a cereja no topo do bolo.
Ao fim de duas horas e trinta minutos de música dá-se o regresso a casa, com um imenso ar de satisfação a inundar os rostos de um público que viveu uma noite de intensas sensações provocadas por uma música e sonoridade que vai muito para além da simples música e que nos cativa e prende, ao ponto de chegar a parecer que não respiramos.